
O presidente do Turismo de Portugal não está satisfeito com a situação que se vive no aeroporto de Lisboa não só porque não está a funcionar como um espaço de acolhimento dos turistas de forma a proporcionar um início de experiência positiva no país, mas também porque está a criar “limitações muito fortes relativamente até à entrada em novos mercados que são estratégicos para Portugal”.
“O aeroporto de Lisboa tem as suas limitações de capacidade, tem dificuldade obviamente em crescer do ponto de vista de rotações, em termos de movimentos. Isso implica que haja limitações muito fortes relativamente até à entrada em novos mercados que são estratégicos para Portugal, pela dificuldade de encontrar slots e espaço na pista para que isso aconteça, mas isso é um trabalho que vamos fazer”, afirma Carlos Abade, no ECO dos Fundos, o podcast quinzenal do ECO sobre fundos europeus.
O responsável está preocupado, sente que “existe desconforto, nomeadamente ao nível das próprias companhias aéreas relativamente a esta situação” e explica que todos estão a trabalhar em várias dimensões nomeadamente para atrair aviões com mais capacidade e mais cheios. Ainda assim, Carlos Abade defende a aposta em maior valor acrescentado e menos volume. “Temos de evoluir no sentido da qualidade. Não devemos evoluir no sentido da massificação”, diz, concluindo perentório que Portugal não tem turismo a mais e que “o turismo tem evoluído e crescido mais nos territórios ditos de baixa densidade do que nos territórios do litoral”.
Portugal tem turismo a mais?
Não, naturalmente que Portugal não tem turismo a mais. Portugal, felizmente, tem um ativo estratégico para a sua economia, que é o turismo. É bom ver que Portugal é o 12.º destino mais competitivo do mundo, o que significa que durante muitos anos fez com que, do ponto de vista de estruturação de oferta, de trabalhar o território, de parcerias, fez com que pudesse competir com os melhores destinos do mundo. Isto significa que para Portugal o turismo é um ativo estratégico que deve aproveitar. O ano passado, o turismo representou 27,7 mil milhões de euros, o que significa 20% das exportações do país. Temos de fazer com que o turismo seja o motor de crescimento, de um crescimento cada vez mais equilibrado e que cumpra aquilo que é a sua função principal. O turismo não é um fim em si mesmo. Não trabalhamos para o turismo. Trabalhamos para que o turismo possa ser um pilar da prosperidade e bem-estar das populações. É isso que nos move no final do dia.
O turismo não é só bom na medida em que gera mais valor para a economia. É bom na medida em que gera cada vez mais valor para as pessoas e para o seu bem-estar. Mas esta preocupação é uma preocupação que tem de estar constantemente nas nossas agendas: como é que fazemos com que este setor, particularmente importante, poderoso, impacte cada vez melhor nas comunidades? Isso significa também tratar de alguns temas que têm de ser tratados para que este crescimento seja cada vez mais equilibrado.
O turismo continua muito concentrado em Lisboa, Porto e Algarve, e tem como consequências o aumento dos preços do imobiliário, peso nas infraestruturas, na limpeza da cidade. A discussão se há ou não turismo a mais faz algum sentido por isso.
O país tem de evoluir, de crescer. Se olharmos para a cidade de Lisboa, por exemplo, e compararmos com o que era há 20 anos, percebemos que Lisboa cresceu, expandiu-se, melhorou, teve capacidade de receber mais turistas e, sobretudo, poder partilhar cada vez mais espaços entre os residentes e os que visitam. O país não pode ser algo imóvel, tem de ir constantemente melhorando as suas infraestruturas, mobilidade e gestão. Hoje temos de ter cada vez mais a noção de que o país tem de ser gerido de forma cada vez mais inteligente. Temos de olhar para as dimensões sobre as quais temos de atuar e perceber como podemos trabalhar em articulação, em parceria com os municípios, perceber quais são os temas que se levantam. Em alguns municípios há determinado tipo de problemas que não existem noutros, e temos de os tratar. Temos de preservar este ativo estratégico para Portugal, que é o turismo, e temos de cuidar do nosso território, das nossas pessoas, dos residentes, da nossa cultura. É este equilíbrio, entre uma coisa e outra, que temos cada vez mais de ser inteligentes na sua gestão.
A valorização que resultou da introdução do turismo na cidade de Lisboa ou do Porto foi visível. Há 20 anos eram cidades com debilidades assinaláveis, degradadas, com dificuldades até do ponto de vista social. O turismo ajudou à sua valorização. Passaram a vir empresas que não conseguiam exercer lá a sua atividade, empresas de maior valor acrescentado. Houve uma valorização da cidade. Isso é bom, isso é natural. É esse o caminho que temos de fazer — basicamente aumentar a criação de riqueza, para depois podermos aumentar o rendimento das pessoas.
Quando estamos a investir imenso no turismo literário, na dimensão da gastronomia, em dimensões da cultura relacionadas com o programa Revive, que visa renovar monumentos nacionais e imóveis de interesse público que estão degradados.
Portugal não ganharia mais em apostar em segmentos de maior valor acrescentado? Menos turistas, mas cada turista a gastar mais?
Esse é o caminho que tem vindo a ser feito. A evolução das receitas do turismo versus a evolução do número de turistas tem sido muito mais favorável às receitas do que ao número de turistas. É em resultado disso que temos vindo a conseguir criar uma oferta de turismo, hoteleira, restauração, que é cada vez mais estruturada, sofisticada e capaz de entrar em segmentos de maior valor acrescentado. Temos de evoluir no sentido da qualidade. Não devemos evoluir no sentido da massificação. Não podemos, por um lado, dizer que não queremos massificação e, ao mesmo lado, criticar a qualidade quando essa leva a um aumento de preço. A qualidade implica trabalhar mais, pagar melhores salários, valorizar cada vez mais as propostas de valor, posicionar a proposta de valor em segmentos de cada vez maior valor acrescentado.
Quando olha para o trabalho que tem vindo a ser desenvolvido, está satisfeito com a vertente de coesão que o turismo tem trazido a Portugal?
O turismo tem evoluído e crescido mais nos territórios ditos de baixa densidade do que nos territórios do litoral. Tem crescido cerca de 3%, média anual. Este valor deveria ser cada vez maior. O nosso propósito é que esta capacidade enorme que o turismo tem de criar valor, deve chegar a todo o território. Isso é bom, porque, de certa forma, ajuda a que os fluxos turísticos se dispersem mais pelo território. E é bom na exata medida em que cria valor para as pessoas e os residentes desses mesmos territórios.
O turismo é uma ferramenta extraordinária para a coesão do país, pois tem a capacidade de levar a esses outros territórios poder de compra, que de outra forma não tinha, e que pode justificar e fundamentar a abertura de empresas, a atração e retenção de pessoas. Esse é um processo que o turismo considera que é uma responsabilidade sua. Significa que teremos de investir cada vez mais para criar melhores condições para que as pessoas possam conhecer o resto do país.
Isso significa o quê?
Significa muita coisa: qualificar o território, as infraestruturas, gerir cada vez mais a mobilidade no território. Um turista, quando vai para o interior do país, precisa saber como chega lá. Como gerimos o tema rodoviário, como proporcionamos melhores experiências por via do transporte ferroviário, como preparamos o país para um capítulo em que o crescimento seja cada vez maior nos territórios do interior, é um desafio. Aliás, um desafio identificado no contexto da preparação da Estratégia de Turismo de 2035.
Porque não se aposta mais na utilização do aeroporto de Beja? Uma infraestrutura paga, com fundos europeus, a funcionar e que permitiria colocar mais turistas no interior do país?
As companhias aéreas é que decidem quais as rotas que fazem, quais os aeroportos que utilizam, em função da procura que se regista. Não podemos definir para onde vão as rotas. Dentro daquilo que é o modelo de desenvolvimento económico de cada companhia aérea, decidem onde vão aterrar. É essa dimensão que temos vindo a trabalhar.
Podemos, por exemplo, proibir a utilização de voos low cost no aeroporto de Lisboa? Ajudaria a descongestionar o aeroporto.
Proibir, creio que não, estamos numa economia liberalizada.
Dar incentivos positivos para…
O Turismo de Portugal, em articulação com as regiões, tem trabalhado com todas as companhias aéreas e com todos os aeroportos nacionais, para criar condições para que a conectividade aérea beneficie todo o país, seja cada vez maior e de maior valor. Estamos a entrar em mercados estratégicos, de cada vez maior valor acrescentado. Já é conhecido o boom do mercado norte-americano. Todos os aeroportos nacionais estão ligados ao mercado norte-americano. Mas temos vindo a trabalhar noutros mercados, como a Ásia, onde temos duas rotas diretas, uma de muito perto de Pequim e outra de Seul. São mercados onde reconhecemos uma estadia mais longa no território, um gasto maior e, por isso, segmentos de mercado de maior valor acrescentado. E fazemos isso trabalhando o mercado, as companhias aéreas e a articulação com todos os aeroportos.
Tendo muito esta lógica, que é de que a criação de valor vai ocorrer por via da distribuição desse valor por todo o território. Para isso há que trabalhar cada vez outros produtos turísticos, que permitam inovar a nossa proposta de valor e de acordo com aquilo que são as exigências dos mercados.
Está preocupado com as dificuldades sempre acrescidas que se vão verificam no aeroporto de Lisboa?
Todos temos de estar preocupados, naturalmente. Preocupados no sentido de que não é, obviamente, a situação que gostaríamos de estar a viver. A experiência do turista começa muito antes de chegar ao país e quando chega, uma percentagem significativa começa exatamente nos aeroportos. Esta dimensão de permitir que a experiência e a entrada num país decorra da melhor forma possível é algo que tem de estar sempre nas nossas preocupações. Logo, quando isto não se passa, naturalmente é um motivo de preocupação. Sabemos que o Governo tem estado a tratar do assunto, sabemos que tem várias dimensões a ter em consideração, a entrada em vigor do novo sistema automático de entrada das pessoas no espaço Schengen, mas isso não significa muito. Significa apenas que temos de trabalhar mais para que de facto consigamos superar as dificuldades que agora estamos a sentir.
Temos de trabalhar mais para que de facto consigamos superar as dificuldades que agora estamos a sentir.
Sente que já existe algum impacto negativo junto dos turistas?
Sinto que existe desconforto, nomeadamente ao nível das próprias companhias aéreas relativamente a esta situação. É natural, aquilo que temos de transmitir é que, de facto, estamos a trabalhar, todos em conjunto, para encontrar as melhores soluções que permitam rapidamente resolver a situação. Não estamos satisfeitos com a situação, antes pelo contrário. Portanto temos de trabalhar para que isso seja resolvido em todos os aeroportos. Não só em Lisboa, mas em todos os aeroportos para que sejam espaços de acolhimento dos turistas e que seja o início de uma boa experiência dentro do país e não de uma má experiência, que depois pode marcar a viagem a Portugal.
Se queremos construir um país, e queremos, que se caracterize por trabalhar em valor acrescentado e não em volume, temos de melhorar a qualidade do país em todas as suas dimensões. E uma tem a ver, naturalmente, com as suas infraestruturas.
O novo aeroporto só em 2037. É muito tempo para aguentar a portela nesta situação…
Naturalmente seria melhor se fosse mais cedo. E tudo indica que eventualmente poderá ser mais cedo do que 2037, espero eu. O aeroporto de Lisboa tem as suas limitações de capacidade, tem dificuldade obviamente em crescer do ponto de vista de rotações, em termos de movimentos. Isso implica que haja limitações muito fortes relativamente até à entrada em novos mercados que são estratégicos para Portugal, pela dificuldade de encontrar slots e espaço na pista para que isso aconteça, mas isso é um trabalho que vamos fazer. Está previsto que haja investimento para que possa haver um ligeiro aumento de movimentos no aeroporto de Lisboa, durante este período, que vai de hoje até à altura em que o aeroporto estiver pronto.
Temos de também trabalhar ao nível da dimensão das aeronaves, que vêm, porque se forem maiores, trazem mais passageiros. Temos de trabalhar no aumento do load factor das aeronaves, ou seja, aumentar a taxa de ocupação das aeronaves para que haja a capacidade de crescer, nomeadamente em mercados que para nós são estratégicos e, para isso, precisamos de rotas para esse efeito. Isto é acompanhado de um trabalho com outros aeroportos.
Há 15 ou 20 anos, penso que se dizia que o limite de capacidade eram 16 milhões. Hoje vamos em já mais de 30 milhões de passageiros.
Não é necessário que as rotas venham todas para Lisboa.
Temos vindo a trabalhar com os aeroportos do Porto, Faro, Funchal e Ponta Delgada, que têm capacidade para crescer ainda. Agora, passa muito pela gestão cada vez mais inteligente da infraestrutura, neste caso, aeroportuária de Lisboa, pelo investimento que vai ser feito, por alterações de processo e que implicam uma evolução ao nível dos passageiros. Aliás, se verificar os números à data de hoje, o número de passageiros em Lisboa é maior do que no ano passado. Se há 15 ou 16 anos perguntasse…
Se este número de passageiros era possível?
Exatamente. Nunca se pensaria. Há 15 ou 20 anos, penso que se dizia que o limite de capacidade eram 16 milhões. Hoje vamos em já mais de 30 milhões de passageiros. Não podemos deixar de ver isto com a seriedade que o assunto tem. É de facto uma limitação, temos de trabalhar o melhor possível a infraestrutura, temos de criar condições para que ela possa aumentar os movimentos, ligeiramente, tendo em conta os investimentos que possam ser feitos. E temos de trabalhar também do ponto de vista da dimensão das aeronaves, mas sendo certo que esta dimensão tem também muito a ver com o espaço na plataforma, por isso, tem de se gerir as slots, o espaço na plataforma e a capacidade das aeronaves.

O presidente do Turismo de Portugal não está satisfeito com a situação que se vive no aeroporto de Lisboa não só porque não está a funcionar como um espaço de acolhimento dos turistas de forma a proporcionar um início de experiência positiva no país, mas também porque está a criar “limitações muito fortes relativamente até à entrada em novos mercados que são estratégicos para Portugal”.
“O aeroporto de Lisboa tem as suas limitações de capacidade, tem dificuldade obviamente em crescer do ponto de vista de rotações, em termos de movimentos. Isso implica que haja limitações muito fortes relativamente até à entrada em novos mercados que são estratégicos para Portugal, pela dificuldade de encontrar slots e espaço na pista para que isso aconteça, mas isso é um trabalho que vamos fazer”, afirma Carlos Abade, no ECO dos Fundos, o podcast quinzenal do ECO sobre fundos europeus.
O responsável está preocupado, sente que “existe desconforto, nomeadamente ao nível das próprias companhias aéreas relativamente a esta situação” e explica que todos estão a trabalhar em várias dimensões nomeadamente para atrair aviões com mais capacidade e mais cheios. Ainda assim, Carlos Abade defende a aposta em maior valor acrescentado e menos volume. “Temos de evoluir no sentido da qualidade. Não devemos evoluir no sentido da massificação”, diz, concluindo perentório que Portugal não tem turismo a mais e que “o turismo tem evoluído e crescido mais nos territórios ditos de baixa densidade do que nos territórios do litoral”.
Portugal tem turismo a mais?
Não, naturalmente que Portugal não tem turismo a mais. Portugal, felizmente, tem um ativo estratégico para a sua economia, que é o turismo. É bom ver que Portugal é o 12.º destino mais competitivo do mundo, o que significa que durante muitos anos fez com que, do ponto de vista de estruturação de oferta, de trabalhar o território, de parcerias, fez com que pudesse competir com os melhores destinos do mundo. Isto significa que para Portugal o turismo é um ativo estratégico que deve aproveitar. O ano passado, o turismo representou 27,7 mil milhões de euros, o que significa 20% das exportações do país. Temos de fazer com que o turismo seja o motor de crescimento, de um crescimento cada vez mais equilibrado e que cumpra aquilo que é a sua função principal. O turismo não é um fim em si mesmo. Não trabalhamos para o turismo. Trabalhamos para que o turismo possa ser um pilar da prosperidade e bem-estar das populações. É isso que nos move no final do dia.
O turismo não é só bom na medida em que gera mais valor para a economia. É bom na medida em que gera cada vez mais valor para as pessoas e para o seu bem-estar. Mas esta preocupação é uma preocupação que tem de estar constantemente nas nossas agendas: como é que fazemos com que este setor, particularmente importante, poderoso, impacte cada vez melhor nas comunidades? Isso significa também tratar de alguns temas que têm de ser tratados para que este crescimento seja cada vez mais equilibrado.
O turismo continua muito concentrado em Lisboa, Porto e Algarve, e tem como consequências o aumento dos preços do imobiliário, peso nas infraestruturas, na limpeza da cidade. A discussão se há ou não turismo a mais faz algum sentido por isso.
O país tem de evoluir, de crescer. Se olharmos para a cidade de Lisboa, por exemplo, e compararmos com o que era há 20 anos, percebemos que Lisboa cresceu, expandiu-se, melhorou, teve capacidade de receber mais turistas e, sobretudo, poder partilhar cada vez mais espaços entre os residentes e os que visitam. O país não pode ser algo imóvel, tem de ir constantemente melhorando as suas infraestruturas, mobilidade e gestão. Hoje temos de ter cada vez mais a noção de que o país tem de ser gerido de forma cada vez mais inteligente. Temos de olhar para as dimensões sobre as quais temos de atuar e perceber como podemos trabalhar em articulação, em parceria com os municípios, perceber quais são os temas que se levantam. Em alguns municípios há determinado tipo de problemas que não existem noutros, e temos de os tratar. Temos de preservar este ativo estratégico para Portugal, que é o turismo, e temos de cuidar do nosso território, das nossas pessoas, dos residentes, da nossa cultura. É este equilíbrio, entre uma coisa e outra, que temos cada vez mais de ser inteligentes na sua gestão.
A valorização que resultou da introdução do turismo na cidade de Lisboa ou do Porto foi visível. Há 20 anos eram cidades com debilidades assinaláveis, degradadas, com dificuldades até do ponto de vista social. O turismo ajudou à sua valorização. Passaram a vir empresas que não conseguiam exercer lá a sua atividade, empresas de maior valor acrescentado. Houve uma valorização da cidade. Isso é bom, isso é natural. É esse o caminho que temos de fazer — basicamente aumentar a criação de riqueza, para depois podermos aumentar o rendimento das pessoas.
Quando estamos a investir imenso no turismo literário, na dimensão da gastronomia, em dimensões da cultura relacionadas com o programa Revive, que visa renovar monumentos nacionais e imóveis de interesse público que estão degradados.
Portugal não ganharia mais em apostar em segmentos de maior valor acrescentado? Menos turistas, mas cada turista a gastar mais?
Esse é o caminho que tem vindo a ser feito. A evolução das receitas do turismo versus a evolução do número de turistas tem sido muito mais favorável às receitas do que ao número de turistas. É em resultado disso que temos vindo a conseguir criar uma oferta de turismo, hoteleira, restauração, que é cada vez mais estruturada, sofisticada e capaz de entrar em segmentos de maior valor acrescentado. Temos de evoluir no sentido da qualidade. Não devemos evoluir no sentido da massificação. Não podemos, por um lado, dizer que não queremos massificação e, ao mesmo lado, criticar a qualidade quando essa leva a um aumento de preço. A qualidade implica trabalhar mais, pagar melhores salários, valorizar cada vez mais as propostas de valor, posicionar a proposta de valor em segmentos de cada vez maior valor acrescentado.
Quando olha para o trabalho que tem vindo a ser desenvolvido, está satisfeito com a vertente de coesão que o turismo tem trazido a Portugal?
O turismo tem evoluído e crescido mais nos territórios ditos de baixa densidade do que nos territórios do litoral. Tem crescido cerca de 3%, média anual. Este valor deveria ser cada vez maior. O nosso propósito é que esta capacidade enorme que o turismo tem de criar valor, deve chegar a todo o território. Isso é bom, porque, de certa forma, ajuda a que os fluxos turísticos se dispersem mais pelo território. E é bom na exata medida em que cria valor para as pessoas e os residentes desses mesmos territórios.
O turismo é uma ferramenta extraordinária para a coesão do país, pois tem a capacidade de levar a esses outros territórios poder de compra, que de outra forma não tinha, e que pode justificar e fundamentar a abertura de empresas, a atração e retenção de pessoas. Esse é um processo que o turismo considera que é uma responsabilidade sua. Significa que teremos de investir cada vez mais para criar melhores condições para que as pessoas possam conhecer o resto do país.
Isso significa o quê?
Significa muita coisa: qualificar o território, as infraestruturas, gerir cada vez mais a mobilidade no território. Um turista, quando vai para o interior do país, precisa saber como chega lá. Como gerimos o tema rodoviário, como proporcionamos melhores experiências por via do transporte ferroviário, como preparamos o país para um capítulo em que o crescimento seja cada vez maior nos territórios do interior, é um desafio. Aliás, um desafio identificado no contexto da preparação da Estratégia de Turismo de 2035.
Porque não se aposta mais na utilização do aeroporto de Beja? Uma infraestrutura paga, com fundos europeus, a funcionar e que permitiria colocar mais turistas no interior do país?
As companhias aéreas é que decidem quais as rotas que fazem, quais os aeroportos que utilizam, em função da procura que se regista. Não podemos definir para onde vão as rotas. Dentro daquilo que é o modelo de desenvolvimento económico de cada companhia aérea, decidem onde vão aterrar. É essa dimensão que temos vindo a trabalhar.
Podemos, por exemplo, proibir a utilização de voos low cost no aeroporto de Lisboa? Ajudaria a descongestionar o aeroporto.
Proibir, creio que não, estamos numa economia liberalizada.
Dar incentivos positivos para…
O Turismo de Portugal, em articulação com as regiões, tem trabalhado com todas as companhias aéreas e com todos os aeroportos nacionais, para criar condições para que a conectividade aérea beneficie todo o país, seja cada vez maior e de maior valor. Estamos a entrar em mercados estratégicos, de cada vez maior valor acrescentado. Já é conhecido o boom do mercado norte-americano. Todos os aeroportos nacionais estão ligados ao mercado norte-americano. Mas temos vindo a trabalhar noutros mercados, como a Ásia, onde temos duas rotas diretas, uma de muito perto de Pequim e outra de Seul. São mercados onde reconhecemos uma estadia mais longa no território, um gasto maior e, por isso, segmentos de mercado de maior valor acrescentado. E fazemos isso trabalhando o mercado, as companhias aéreas e a articulação com todos os aeroportos.
Tendo muito esta lógica, que é de que a criação de valor vai ocorrer por via da distribuição desse valor por todo o território. Para isso há que trabalhar cada vez outros produtos turísticos, que permitam inovar a nossa proposta de valor e de acordo com aquilo que são as exigências dos mercados.
Está preocupado com as dificuldades sempre acrescidas que se vão verificam no aeroporto de Lisboa?
Todos temos de estar preocupados, naturalmente. Preocupados no sentido de que não é, obviamente, a situação que gostaríamos de estar a viver. A experiência do turista começa muito antes de chegar ao país e quando chega, uma percentagem significativa começa exatamente nos aeroportos. Esta dimensão de permitir que a experiência e a entrada num país decorra da melhor forma possível é algo que tem de estar sempre nas nossas preocupações. Logo, quando isto não se passa, naturalmente é um motivo de preocupação. Sabemos que o Governo tem estado a tratar do assunto, sabemos que tem várias dimensões a ter em consideração, a entrada em vigor do novo sistema automático de entrada das pessoas no espaço Schengen, mas isso não significa muito. Significa apenas que temos de trabalhar mais para que de facto consigamos superar as dificuldades que agora estamos a sentir.
Temos de trabalhar mais para que de facto consigamos superar as dificuldades que agora estamos a sentir.
Sente que já existe algum impacto negativo junto dos turistas?
Sinto que existe desconforto, nomeadamente ao nível das próprias companhias aéreas relativamente a esta situação. É natural, aquilo que temos de transmitir é que, de facto, estamos a trabalhar, todos em conjunto, para encontrar as melhores soluções que permitam rapidamente resolver a situação. Não estamos satisfeitos com a situação, antes pelo contrário. Portanto temos de trabalhar para que isso seja resolvido em todos os aeroportos. Não só em Lisboa, mas em todos os aeroportos para que sejam espaços de acolhimento dos turistas e que seja o início de uma boa experiência dentro do país e não de uma má experiência, que depois pode marcar a viagem a Portugal.
Se queremos construir um país, e queremos, que se caracterize por trabalhar em valor acrescentado e não em volume, temos de melhorar a qualidade do país em todas as suas dimensões. E uma tem a ver, naturalmente, com as suas infraestruturas.
O novo aeroporto só em 2037. É muito tempo para aguentar a portela nesta situação…
Naturalmente seria melhor se fosse mais cedo. E tudo indica que eventualmente poderá ser mais cedo do que 2037, espero eu. O aeroporto de Lisboa tem as suas limitações de capacidade, tem dificuldade obviamente em crescer do ponto de vista de rotações, em termos de movimentos. Isso implica que haja limitações muito fortes relativamente até à entrada em novos mercados que são estratégicos para Portugal, pela dificuldade de encontrar slots e espaço na pista para que isso aconteça, mas isso é um trabalho que vamos fazer. Está previsto que haja investimento para que possa haver um ligeiro aumento de movimentos no aeroporto de Lisboa, durante este período, que vai de hoje até à altura em que o aeroporto estiver pronto.
Temos de também trabalhar ao nível da dimensão das aeronaves, que vêm, porque se forem maiores, trazem mais passageiros. Temos de trabalhar no aumento do load factor das aeronaves, ou seja, aumentar a taxa de ocupação das aeronaves para que haja a capacidade de crescer, nomeadamente em mercados que para nós são estratégicos e, para isso, precisamos de rotas para esse efeito. Isto é acompanhado de um trabalho com outros aeroportos.
Há 15 ou 20 anos, penso que se dizia que o limite de capacidade eram 16 milhões. Hoje vamos em já mais de 30 milhões de passageiros.
Não é necessário que as rotas venham todas para Lisboa.
Temos vindo a trabalhar com os aeroportos do Porto, Faro, Funchal e Ponta Delgada, que têm capacidade para crescer ainda. Agora, passa muito pela gestão cada vez mais inteligente da infraestrutura, neste caso, aeroportuária de Lisboa, pelo investimento que vai ser feito, por alterações de processo e que implicam uma evolução ao nível dos passageiros. Aliás, se verificar os números à data de hoje, o número de passageiros em Lisboa é maior do que no ano passado. Se há 15 ou 16 anos perguntasse…
Se este número de passageiros era possível?
Exatamente. Nunca se pensaria. Há 15 ou 20 anos, penso que se dizia que o limite de capacidade eram 16 milhões. Hoje vamos em já mais de 30 milhões de passageiros. Não podemos deixar de ver isto com a seriedade que o assunto tem. É de facto uma limitação, temos de trabalhar o melhor possível a infraestrutura, temos de criar condições para que ela possa aumentar os movimentos, ligeiramente, tendo em conta os investimentos que possam ser feitos. E temos de trabalhar também do ponto de vista da dimensão das aeronaves, mas sendo certo que esta dimensão tem também muito a ver com o espaço na plataforma, por isso, tem de se gerir as slots, o espaço na plataforma e a capacidade das aeronaves.
source https://eco.sapo.pt/entrevista/aeroporto-de-lisboa-implica-limitacoes-muito-fortes-a-entrada-em-novos-mercados-estrategicos/











